domingo, 12 de maio de 2013

Três assoalhadas

   
Vive sozinha. Num apartamento de três assoalhadas e alugado, é a sua casa, a vida deu-lhe dois filhos num casamento que acabou. Inicia os dias de trabalho cedo e estende-os noite adentro, por vezes calha passar pelo ginásio, em casa, limita-se ao indispensável, normalmente, as suas refeições são na sala onde aproveita para ver um pouco de televisão, e, deita-se para repetir tudo do mesmo modo no dia seguinte. 

Os fins-de-semana são mais difíceis de preencher, por vezes junta-se a alguns amigos para umas idas ao bar conhecido ou mesmo à disco da zona, mas quando regressa a casa sente o seu próprio acolhimento. 

Hoje não lhe apetece ver televisão, ligou o leitor e deitou-se no sofá a pensar de olhos fechados. 

Quando sai com as amigas e os amigos, perde-se a olhar qual deles o mais divertido, o que fala mais alto, o que sorri mais alto. Um embuste, descobre, o mundo não é assim tão divertido. Ela sabe, as pessoas fingem. Numa saída desabafou com uma conhecida que lhe disse: O passado é passado já não conta, para no seguimento da conversa dizer que tinha saudade do passado. Parola, foi o que pensou. 

Outras ou outros, esforçam-se por mostrar que está tudo bem mas andam perdidas ou perdidos à procura de momentos felizes. À quem lhe chame felicidade. 

Recorda o que teve, o que perdeu, o que podia ter tido, no que lhe passou pela frente, ao lado, pensa na sua vida, não se conforma com a inoperância dos que à sua volta deixam de viver. Já passou dos quarenta e as suas energias dedica-as ao trabalho. Mas todos os dias, todos, deseja que quer mais, a vida não pode ser só isto, não tem de ser só isto, o tempo, tem de ser utilizado, com alguém que ame, que a ame, precisa de sentir a felicidade de momentos de partilha. 

Suspira entre o som que ouve e mexe os lábios sussurrando que não precisa de fingir, que está tudo bem. 

O leitor cala-se, e, o silêncio enche a sala como uma bolha de ar prestes a explodir. Ela abre os olhos e levanta-se, começa a roer uma unha sem se aperceber disso. Falta-lhe alguém, mas não lhe falta saudade, vai para o quarto, despe-se em frente ao espelho, pega no telefone e liga enquanto veste o pijama, uma voz atende e ela pergunta: Tu amas-me? – Sim, desde que brincamos na piscina. Também te amo. Desligou e deitou-se com um livro que não lhe apetece ler. Sem interesse lê uma página, os olhos fecham-se e adormece com ele em cima do peito, os óculos caídos na cara e um sonho que deseja. Horas depois, o despertador a acorda para mais uma viagem a Bremen, afinal, tem tudo o que lhe falta.

Um comentário:

Anônimo disse...

Um dia entrei aqui e passava a música "o que é que você vai fazer domingo á tarde"
Afinal os sonhos sao para se viver.

Um abraço
Naddel